"Não sou contra nenhum tipo de preservação e, muito menos a do acervo histórico, o que sou contra é a falta de manutenção dos referidos imóveis tombados. Na terra de Ventania, podemos citar com orgulho o Palácio dos Ferroviários, que atualmente serve como Paço Municipal, com uma estrutura arquitetônica magnífica, só que é tal qual o dito popular: - “Por fora bela viola, por dentro pão bolorento”, ou seja, maravilhoso e imponente por fora e por dentro além de não servir como centro administrativo, dado a precariedade das instalações e, pelo tombamento total, segundo o ex-ministro Magri, é imexível, está com as instalações atacadas por infiltrações, mofos, cupins, rachaduras, esquadrias deterioradas etc.etc. e não se vê nenhuma atuação do “ferrim de dentista” (Patrimônio Histórico) se mexer no sentido da conservação de tão belo patrimônio."
Dejair Flávio de Lima, advogado e procurador do Município de Araguari.
Interessante comentário de um advogado, procurador do Município de Araguari (cargo comissionado) e formador de opinião em um Jornal da cidade que leva o nome de Correio de Araguari. Advogado competente que é; conhecedor das leis que é; literato que é; exímio defensor - até mesmo do indefensável - que é; com suas palavras demonstra ser o conhecedor da inconhecível matéria jurídica, cultural, filosófica e bolorenta que se chama Patrimônio Histórico.
Deve-se deixar bem claro que o problema do toco da Praça Manoel Bonito é ambiental e não cultural ou histórico. A Praça não é tombada, porém está no entorno do prédio do antigo Cine Rex (que é tombado) e pela Lei Municipal as interferências nas adjacências de bem tombado devem ser autorizadas pelo Conselho de Patrimônio Histórico . Uma ou um conjunto de árvores poderá pertencer ao patrimônio natural de um Município, tombado, protegido ou não. Se fosse um pé de piqui isolado, por exemplo, deveria ser mantido, pois, pelas leis ambientais de proteção do nosso cerrado, o piqui é protegido. Um jurista ou conhecedor de leis deve saber disso.
A Sibipiruna [é uma árvore de grande porte, nativa do Brasil, perenifólia (cujas folhas não caem antes de as novas estarem já desenvolvidas), chegando a medir 28 metros de altura (normalmente entre 6-18m) com até 6 metros de diâmetro da copa arredondada e muito vistosa], pela sua característica não é recomendada para compor a paisagem urbana. Sua retirada, principalmente da Praça Manoel Bonito garantiu a visibilidade de toda sua ambiência em relação aos prédios históricos que foram valorizados arquitetônica e culturalmente. A recomposição arbórea da Praça deverá garantir esta visibilidade com o uso de espécies de pequeno porte.
A introdução dessas espécies (Sibipirunas, Ficus, etc.). nas cidades foi o grande erro de gestores públicos da época (idos das décadas de 1950/60), por falta de conhecimento urbano, botânico e paisagístico. Estas espécies são incompatíveis na composição da paisagem urbana, pois suas raízes são superficiais, seu crescimento é exagerado e danificam as edificações e tubulações de água e esgoto, bem como, a inconveniência de folhas muito pequenas que acabam obstruindo dutos de ventilação dos carros e calhas de tubulação de água pluvial.
Da mesma forma que o nobre Procurador do Município considera certas leis de autoria do executivo ultrapassadas, seria sua função revisá-las e torná-las mais eficientes, inclusive as que regem o Patrimônio Histórico.
A Lei Municipal n° 2449 de 10/02/89 "cria normas de proteção do Patrimônio Histórico e Artístico de Araguari e proporciona incentivos para a implantação", foi aprovada pela Câmara Municipal e sancionada pelo prefeito Vanderlei Inácio - Mãe Preta (gestão 1989-1992). Quem eram os vereadores neste período que aprovaram esta lei? Será que sabiam o que estavam aprovando?
Em 1990, a Câmara Municipal promulgou a Lei Orgânica do Município em 21 de abril de 1990 e veja o que os vereadores da época aprovaram:
"ATO DAS DISPOSIÇÕES GERAIS E TRANSITÓRIAS
(...)
Art. 22 - Ficam tombados, como patrimônio histórico, os seguintes imóveis:
I- o prédio da Câmara Municipal;
II- o prédio da Casa da Cultura;
III- o prédio da antiga estação ferroviária, situado na Praça Gaioso Neves.
Art. 23 - Ficam tombados, para fins de preservação, o Bosque John Kennedy, a Mata do Desamparo e todas as matas situadas em cabeceiras de nascentes de água, dentro do Município.
(...)"
Até parece piada, mas aqueles (os grifados) que criticam o patrimônio histórico hoje, foram os mesmos que fizeram os tombamentos na Lei Orgânica, tais sejam os vereadores da época e seu cargos:
Joaquim Vieira Peixoto- Presidente da Câmara
Astério de Sousa Mota -Vice-Presidente (atual diretor do Jornal Correio de Araguari)
Gilberto César de Faria- 1º Secretário e Relator Adjunto
Alaor Alves de Melo- 2º Secretário
Joaquim Farias de Godoi- Presidente Relator da L.O. (atual redator do Jornal Correio de Araguari)
Cairo Antônio Guedes- Relator Adjunto
Clayton José Brasil- Relator Adjunto
Luiz Sícari- Relator Adjunto
Amador Gomes Duarte- Vereador
Antônio Rodrigues Tosta- Vereador
Cairo Gomes Vieira- Vereador
Elson de Oliveira- Vereador
Limírio Martins Parreira- Vereador (sem comentários)
Marcos Coelho de Carvalho- Vereador (atual Prefeito)
Vicente Gonçalves Chaves- Vereador
Sendo assim, observa-se que o discurso atual destas pessoas não condiz com seus atos há 21 anos. O entendimento que se faz disso é que não sabiam e não sabem o que dizem ou fazem até hoje.
Com relação a afirmação do Sr. Dejair Flávio de Lima que o tombamento total é "imexível" é a total falta de conhecimento das Leis, normas, Cartas Patrimoniais e Recomendações internacionais existentes, tais como:
Carta de Atenas - Sociedade das Nações - outubro de 1931; Carta de Atenas - CIAM - novembro de 1933; Recomendação de Nova Delhi; Recomendação Paris 1962; Carta de Veneza; Recomendação Paris 1964; Normas de Quito; Recomendação Paris 1968; Compromisso Brasília 1970; Compromisso Salvador; Carta do Restauro; Declaração de Estocolmo; Recomendação Paris 1972; Resolução de São Domingos; Declaração de Amsterdã; Manifesto Amsterdã; Carta do Turismo Cultural; Recomendações de Nairóbi; Carta de Machu Picchu; Carta de Burra; Carta de Florença; Declaração de Nairóbi; Declaração Tlaxcala; Declaração do México; Carta de Washington 1986; Carta Petrópolis; Carta de Washington 1987; Carta de Cabo Frio; Declaração de São Paulo; Recomendação Paris 1989; Carta de Lausanne; Carta do Rio; Conferência de Nara; Carta Brasília 1995; Recomendação Europa de 1995; Declaração de Sofia; Declaração de São Paulo II; Carta de Fortaleza; Carta de Mar del Plata; Cartagenas de Índias - Colômbia; Recomendação Paris 2003. Ou tudo isso é desprezível sob o olhar jurídico?
Quando o bem tombado necessita de manutenção, esta deverá ser feita com critério e por profissionais habilitados e, sobretudo, com a anuência do Conselho de Patrimônio Histórico municipal ou estadual ou federal dependendo do nível de tombamento do bem observando regras e conceitos internacionais.
Com relação ao Palácio dos Ferroviários a ação de "passar um batom" no mesmo foi da atual administração, pintando-o apenas externamente para dar a impressão a sociedade que a atual gestão cuida do patrimônio histórico da cidade. A responsabilidade de cuidar das "infiltrações, mofos, cupins, rachaduras, esquadrias deterioradas etc.etc." é do governo municipal, detentor da verba pública para tais investimentos e não do Conselho que não detém orçamento para tais obras. Relatórios de Manutenção foram entregues, em 2009 e em 2011, aos gestores públicos com todos os serviços que devem ser executados, porém, nada disso foi feito pelo governo municipal que não cuida da sua própria casa e quer cuidar da casa alheia. Senta no próprio rabo e aponta o rabo alheio.
Recentemente foi aprovado, pela Câmara Municipal. o Fundo de Preservação do Patrimônio Histórico, porém, a verba destinada por Lei não é depositada pela Secretaria de Fazenda com frequência na conta do Fundo e, assim, a falta de verba pelo descompromisso público com o Patrimônio Histórico inviabiliza a manutenção dos bens tombados, como por exemplo de bens públicos: a Estação de Stevenson, o Prédio da Prada/CEMIG; o Bosque John Kennedy, o prédio da FAEC, a Mata do Desamparo e o próprio prédio do Palácio dos Ferroviários e de todos os anexos ocupados pela Prefeitura Municipal da antiga sede da Rede Ferroviária Federal S/A; dirá dos bens particulares.
Tombamento não é desapropriação, portanto a responsabilidade pela manutenção dos bens tombados particulares é de seus proprietários ou utilizadores.
O grande foco do discurso (falta de argumento) contra o patrimônio histórico é sempre que ele impede o desenvolvimento da cidade e o seu progresso. Pena que estas pessoas que desconhecem a sua própria história e suas origens, também desconhecem que desenvolvimento e progresso sem inclusão do patrimônio histórico é apenas uma ilusão, pois não estarão alicerçados. Uma das formas de desenvolvimento de uma cidade e que atrai investimentos, principalmente, pela indústria do turismo, é o patrimônio histórico. Mas, é querer demais dizer aos incautos defensores do progresso e do desenvolvimento que, além de ser uma obrigação moral a preservação histórica e cultural de um povo, este mesmo patrimônio gera renda ao Município, tanto pelo ICMS Cultural, quanto pelo Turismo a ser explorado, além de ser uma obrigação legal atribuída pelo Estatuto das Cidades e, sobretudo pela Constituição Federal de 1988, conforme texto:
"Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
(...)
III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;
IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;
V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência;
VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;
VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;
(...)"
Será que o douto advogado não conhece a Constituição Federal ou esta Lei é apenas ilustrativa?
Mas, falar em desenvolvimento e progresso para uma turma que pensa que isso significa apenas asfalto e prédios altos, fica complicado, bem como, se esta turma foi a mesma que tombou prédios históricos e hoje sofrem de amnésia.
Quero informar aos leitores que este neófito arquiteto e urbanista estuda a matéria e tem muito ainda a aprender, tanto com os pensadores teóricos, como com os grandes sábios da dialética popular que divagam seu conhecimento sobre o inconhecível patrimônio histórico.
Atualizada em 20/05/2011 as 6:45h
Quero informar aos leitores que este neófito arquiteto e urbanista estuda a matéria e tem muito ainda a aprender, tanto com os pensadores teóricos, como com os grandes sábios da dialética popular que divagam seu conhecimento sobre o inconhecível patrimônio histórico.
Atualizada em 20/05/2011 as 6:45h
Alessandre, parabéns pela aula. Esse texto deveria ser leitura obrigatória para aqueles que usam o Direito, os microfones e os jornais apenas para atacar, sem fundamentos, as pessoas que conhecem o assunto.
ResponderExcluirE o sr. Dejair foi Conselheiro do Patrimônio Histórico até o começo de 2011. O sr. Limírio Martins ainda o é até hoje. Acho que ele nem sabe disso.
ResponderExcluirBom Dia, olha essa sua contestação e manifestação equilibrada justifica sua competencia e dedicação ao Patrimônio Histórico. Parabéns.
ResponderExcluirMário
(mensagem enviada via gmail.com)